sexta-feira, 30 de abril de 2010

DISSERTAÇÃO

Dissertar é debater um tema, é apresentar e defender idéias a respeito de um assunto proposto como problema para ser discutido. A atividade dissertativa revela-se vital para o desenvolvimento da inteligência, para a elaboração pessoal de idéias, para a capacidade de raciocínio e para exposição lógica. Por esse motivo, dissertar requer, antes de tudo, um conhecimento aprofundado do tema, um planejamento cuidadoso do texto e um desenvolvimento eficiente da prosa.

O conhecimento aprofundado do tema é resultado de boas práticas de leitura. Ler constantemente aumenta o conhecimento de mundo e desenvolve a prática interpretativa, requisitos indispensáveis para se escrever. Além disso, o conhecimento aprofundado de uma temática é também consequência da compreensão da proposta de escrita e da utilização dos textos de apoio. Ora, não saber com exatidão o que necessariamente deve-se escrever resulta, obviamente, em problemas quanto ao tema: a fuga ou a inadequação.

Já o planejamento do texto consiste na forma como se organiza as idéias no papel. Nada adianta saber deveras o assunto, se não se consegue sistematizá-lo de forma inteligível. Por esse motivo, a dissertação deve se originar de um bom plano textual (PT), no qual o autor planeje a forma de argumentação, os argumentos e os exemplos a serem utilizados. Isso influenciará na paragrafação do texto, uma vez que, ao fazer o PT, cada parágrafo do texto ganha vida antes mesmos de ser escrito.

O conhecimento vasto e a boa organização textual, entretanto, só serão eficientes se a dissertação não apresentar problemas na prosa. Ideias originais organizadas de forma clara e objetiva podem ser colocadas a perder, caso o texto dissertativo tenha problemas quanto a termos erroneamente usados, a frases mal formuladas e a pontuação impropriamente empregada. Dissertar requer linguagem precisa, não rebuscada, mas bem formulada, pois não se pode colocar ideias a perder por causa de inadequações de linguagem.

Vê-se, portanto, que dissertar requer não apenas criatividade, mas organização e planejamento também. Isso porque a tipologia dissertativa é mais calcada na lógica do que na ficção, caracteriza-se mais pelo ato de persuadir do pelo ato de informar ou de entreter. Dissertar é, pois, argumentar, é agir diretamente no mundo, é mostrar a própria voz e demonstrar que ela tem valor.

NARRAÇÃO - ESTRUTURA

A narrativa ortodoxamente divide-se em três partes: Apresentação, Desenvolvimento e Desfecho.

Apresentação

É necessário apresentar ao leitor a história como um todo. Então pensemos que as personagens, o cenário, os fatos ocorridos, o motivo que provocou o enredo, o período de tempo, tudo isso deve ser apresentado diante do leitor para que ele possa captar os sentidos daquilo que é narrado. Quando surge uma personagem nova, ou o ambiente muda, é preciso que o leitor "veja", note e perceba cada passo sugerido pelas mudanças. É o narrador é quem revela tudo isso.

Desenvolvimento

O desenvolvimento é o próprio enredo (as ações, os fatos seqüenciados coerentemente) que deve revelar a trama (entre as personagens, ou de uma personagem em conflito pessoal). A trama, ou conflito, é o ponto alto do enredo, é o "problema" criado pelo escritor para promover a expectativa do leitor. É no conflito que encontramos o clímax, ou seja, o ponto maior, o ápice dos acontecimentos.

Desfecho

Com a revelação do Clímax, a trama já pode – e deve – ser resolvida. O conflito precisa ser solucionado. Isso é perceptível nas redações de vestibular, quando o número de linhas é relativamente limitado e não raramente o Clímax e o desfecho são coincidentes.

Poema tirado de uma notícia de jornal

João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número

Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro

Bebeu

Cantou

Dançou

Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

(Manoel Bandeira)

- Apresentação: "João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número"

- Desenvolvimento:

- Conflito: "Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro"

- Clímax: "Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas"

- Desfecho: "e morreu afogado."

* Texto adaptado de "Língua Portuguesa 6". Editora COC.

NARRAÇÃO – ELEMENTOS

É comum, nas narrativas, se encontrar os seguintes elementos:

Foco narrativo

Para contar uma história é preciso que o narrador tenha exposta a sua voz, ou o seu foco narrativo.

- Narrador-Observador: É aquele que conta a história através de uma perspectiva de fora da história. Ele não se confunde com nenhum personagens. Este foco narrativo se dá, predominantemente, em terceira pessoa.

- Narrador Personagem: É aquele que conta a história através de uma perspectiva de dentro da história. Ele, de alguma forma, participa do enredo, sendo um dos personagens da história. Este foco narrativo se dá, predominantemente, em primeira.

Personagens

Suportam o enredo, visto que é através delas que a ação se concretiza. Adquirem "forma" durante a evolução da narrativa, ao que conhecemos por caracterização.

Cenário

Numa narrativa podem aparecer vários ambientes diferentes, nos quais os fatos determinantes do enredo se desenrolam. A sua apresentação ao leitor pode ser feita, de acordo com o estilo da história, objetiva ou subjetivamente, por essa razão caracterizá-lo(s) valorizando detalhes pode realçar, e muito, o "clima" da história. O cenário é uma das mais importantes categorias da narrativa.

Tempo

Há formas distintas de o narrador revelar o tempo em que os fatos aconteceram:

- Tempo cronológico: é o tempo real, cuja marcação pode ser prevista pelo leitor (anos, meses, dias, horas, poucos instantes).

- Tempo psicológico: aquele que flui da mente das personagens.

Poema tirado de uma notícia de jornal

João Gostoso era carregador de feira livre e morava no morro da Babilônia num barracão sem número

Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro

Bebeu

Cantou

Dançou

Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e morreu afogado.

(Manoel Bandeira)

- Foco narrativo: "Narrador observador".

- Personagem: "João Gostoso"

- Cenário: "Bar vinte de Novembro / Lagoa Rodrigo de Freitas. "

- Temporalidade: "Uma noite chegou > Depois se atirou".

* Texto adaptado de "Língua Portuguesa 6". Editora COC.

NARRAÇÃO

Compreendemos como narração o início, o meio e o fim de uma cadeia de acontecimentos coerentes, todos determinados por uma relação temporal lógica, através da qual a transformação das personagens fica evidente ao longo do enredo. É contar uma história, real ou fictícia.

Depois do jantar

Também, que idéia a sua: andar a pé, margeando a Lagoa Rodrigo de Freitas, depois do jantar. O vulto caminhava em sua direção, chegou bem perto, estacou à sua frente. Decerto ia pedir-lhe um auxílio.

— Não tenho trocado. Mas tenho cigarros. Quer um?

— Não fumo, respondeu o outro.

Então ele queria é saber as horas. Levantou o antebraço esquerdo, consultou o relógio:

— 9 e 17... 9 e 20, talvez. Andaram mexendo nele lá em casa.

— Não estou querendo saber quantas horas são. Prefiro o relógio.

— Como?

— Já disse. Vai passando o relógio.

— Mas ...

— Quer que eu mesmo tire? Pode machucar.

— Não. Eu tiro sozinho. Quer dizer... Estou meio sem jeito. Essa fivelinha enguiça quando menos se espera. Por favor, me ajude.

O outro ajudou, a pulseira não era mesmo fácil de desatar. Afinal, o relógio mudou de dono.

— Agora posso continuar?

— Continuar o quê?

— O passeio. Eu estava passeando, não viu?

— Vi, sim. Espera um pouco.

— Esperar o quê?

— Passa a carteira.

— Mas...

— Quer que eu também ajude a tirar? Você não faz nada sozinho, nessa idade?

— Não é isso. Eu pensava que o relógio fosse bastante. Não é um relógio qualquer, veja bem. Coisa fina. Ainda não acabei de pagar...

— E eu com isso? Então vou deixar o serviço pela metade?

— Bom, eu tiro a carteira. Mas vamos fazer um trato.

— Diga.

— Tou com dois mil cruzeiros. Lhe dou mil e fico com mil.

— Engraçadinho, hem? Desde quando o assaltante reparte com o assaltado o produto do assalto?

— Mas você não se identificou como assaltante. Como é que eu podia saber?

— É que eu não gosto de assustar. Sou contra isso de encostar o metal na testa do cara. Sou civilizado, manja?

— Por isso mesmo que é civilizado, você podia rachar comigo o dinheiro. Ele me faz falta, palavra de honra.

— Pera aí. Se você acha que é preciso mostrar revólver, eu mostro.

— Não precisa, não precisa.

— Essa de rachar o legume... Pensa um pouco, amizade. Você está querendo me assaltar, e diz isso com a maior cara-de-pau.

— Eu, assaltar?! Se o dinheiro é meu, então estou assaltando a mim mesmo.

— Calma. Não baralha mais as coisas. Sou eu o assaltante, não sou?

— Claro.

— Você, o assaltado. Certo?

— Confere.

— Então deixa de poesia e passa pra cá os dois mil. Se é que são só dois mil.

— Acha que eu minto? Olha aqui as quatro notas de quinhentos. Veja se tem mais dinheiro na carteira. Se achar uma nota de 10, de cinco cruzeiros, de um, tudo é seu. Quando eu confundi você com um, mendigo (desculpe, não reparei bem) e disse que não tinha trocado, é porque não tinha trocado mesmo.

— Tá bom, não se discute.

— Vamos, procure nos... nos escaninhos.

— Sei lá o que é isso. Também não gosto de mexer nos guardados dos outros. Você me passa a carteira, ela fica sendo minha, aí eu mexo nela à vontade.

— Deixe ao menos tirar os documentos?

— Deixo. Pode até ficar com a carteira. Eu não coleciono. Mas rachar com você, isso de jeito nenhum. É contra as regras.

— Nem uma de quinhentos? Uma só.

— Nada. O mais que eu posso fazer é dar dinheiro pro ônibus. Mas nem isso você precisa. Pela pinta se vê que mora perto.

— Nem eu ia aceitar dinheiro de você.

— Orgulhoso, hem? Fique sabendo que tenho ajudado muita gente neste mundo. Bom, tudo legal. Até outra vez. Mas antes, uma lembrancinha.

Sacou da arma e deu-lhe um tiro no pé.

(Carlos Drumonnd de Andrade)

Texto extraído do livro "Os dias lindos", Livraria José Olympio Editora — Rio de Janeiro, 1977, pág. 54.

DESCRIÇÃO

A Descrição nada mais é do que uma espécie de foto verbal. É, pois, a sequência tipológica que permite caracterizar um objeto, cenário, personagem, ou algo de ordem abstrata, por meio de palavras. A Descrição geralmente aparece junto de outras tipologias, como forma de enriquecê-las. São, pois, fundamentais momentos descritivos em textos narrativos – por exemplo – para descrever personagens, cenários e temporalidades.

São algumas características da descrição:

- frases sincopadas, curtas e nominais;

- verbos de estado;

- revelações cromáticas e térmicas por meio dos sensores humanos;

- simultaneidade dos fatos;

- adjetivação.

TIPOS DE DESCRIÇÃO

Descrição objetiva

Quando o elemento descrito é apresentado referencialmente, isto é, com precisão e de forma concreta.

Ex.:

Era morena, cabelos longos e lisos, dum castanho forte, como seus olhos. Possuidora de um temperamento dócil até certo ponto, austero e insuportável em outro. Mas formosa e inteligente, não sabia tirar notas abaixo de dez.

Descrição subjetiva

Quando a emoção impera, isto é, quando o elemento descrito assume a visão de quem o escreve.

Ex.:

Nas ocasiões de aparato é que se podia tomar pulso ao homem. Não só as condecorações gritavam-lhe no peito como uma couraça de grilos. Ateneu! Ateneu! Aristarco todo era um anúncio; os gestos, calmos, soberanos, eram de um rei...

POMPÉIA, Raul. In O Ateneu

Descrição estática

Ausência de movimento entre os elementos captados, objetiva ou subjetivamente, por quem os descreve.

Ex.:

As flores do jardim lhe inspiravam tranqüilidade. Quem sabe porque o clima de um cemitério é sempre assim, de silêncio, sem vento, sem papel no chão. Tudo era morte, até dentro do coração dele que, naquele momento, sentiu-se mais morto como todos os que ali jaziam. A pior morte é a da solidão em vida.

Descrição dinâmica

Embora haja movimento, a simultaneidade das ações impede que ocorra de fato a narração de acontecimentos, mas a descrição de movimentos inependentes entre si.

Ex.:

Aquela sala de aula era estranha para ele. Cadeiras azuis, nas quais alguns alunos retorciam-se nas conversas com os colegas, ora rindo, ora sisudos. De um lado havia um grupo de moças que mexiam seus cabelos a todo instante, para lá, depois para cá. De outro, alguns rapazes pareciam disputar um campeonato para se saber quem melhor que o companheiro – ou adversário – conseguia virar a caneta entre os dedos. Aquela seria uma sala de aula, a sua, mais exatamente, por um ano inteiro?

* Texto adaptado de "Língua Portuguesa 6", Editora COC.

sábado, 24 de abril de 2010

FUNÇÕES DA LINGUAGEM

Roman Jakobson, uns dos linguístas responsáveis pela fundação do Círculo Lingüístico de Praga,elaborou da teoria que propõe a determinação de um esquema que represente o ato da fala. Segundo Jakobson, quando um falante qualquer faz uso da língua, verbalmente ou não, ocorre a interação dos seguintes elementos de comunicação:

- emissor: sujeito que produz um discurso e o destino a outrem;

- receptor: sujeito (s) a quem é destinado o discurso;

- canal: meio físico pelo qual o discurso é propagado;

- mensagem: todas as informações que compõem o discurso;

- código: conjunto de signos linguísticos, comum entre os falantes, por meio do qual o receptor consegue decodificar o discurso recebido;

- referente: o contexto, isto é, o assunto sobre o qual se refere o discurso.

Sempre que nos comunicamos, temos uma intenção, uma finalidade. Daí o fato de certas expressões e combinações de vocabulário serem perfeitamente adequadas a certas situações e absolutamente inoportunas em outras. Essa intenção determina as funções da linguagem.

- Função emotiva: também chamada de expressiva, ocorre quando o emissor revela seus sentimentos, opiniões, sensações. Evidencia o uso da 1ª pessoa (singular, plural) e, portanto, a subjetividade de quem fala.

- Função conativa: recebe também o nome de apelativa. Marca o receptor da mensagem quando esta a ele é dirigida em forma de um apelo volitivo ou uma ordem. Por essa razão nela encontramos a 2ª e 3ª pessoas, que são as destinatárias do discurso, ou verbos no imperativo.

- Função fática: entre os interlocutores é necessário um canal de comunicação. É pelo canal que a comunicação se estabelece, por isso ele precisa estar em perfeita harmonia para que nenhum "ruído" coloque em risco o envio, a captação e o entendimento da mensagem. Então, o emissor faz uso de expressões fáticas quando visa estabelecer contato com algum receptor e, também, quando buscar checar o funcionamento e a "limpeza" do canal, sem a preocupação com o conteúdo da mensagem.

- Função poética: tem a finalidade de propor à mensagem determinada singularidade. Por isso a subjetividade e os arranjos sonoro e estético do texto são fundamentais, tão característicos na poesia.

- Função metalingüística: é encontrada quando o código fica em evidência no texto, isto é, quando o código usado na comunicação faz referência a ele mesmo (um texto falando sobre o texto, uma poesia versando sobre o fazer poético, a língua usando das regras (normativas ou não) para explicar-se.

- Função referencial: busca exatamente no contexto sua razão de acontecer. É conhecida também como denotativa e ainda como informativa. O contexto, isto é, o referente, o assunto ao qual se refere toda a mensagem, deve ser explorado com objetividade, usando ao máximo da precisão das informações e com imparcialidade. É características dos textos jornalísticos e científicos.

* Texto adaptado de "Língua Portuguesa 6", Editora COC.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

CRÔNICAS

Abaixo postei algumas crônicas cometidas por mim. Escrevi-as não por falta do que fazer, mas por falta de vontade de fazer as coisas que precisava. Enfim, venho as reformulando há tempos e não chego no ponto que queria. Mas como cobrado, aqui estão elas!

CONVERSA DE CASAL

Depois de um dia cansativo, Zé volta para a sua casa e senta-se no sofá. Vera, sua esposa, que já chegara há algumas horas, olha-o docemente e diz:

- Oi, amore!

- Oi!

[beijinho]

- Você parece cansado...

- Pois é! O dia na firma foi corrido.

- O que aconteceu?

- Correria!

- Ahm... O meu também foi difícil!

- Sério?

- Sim. Tive um problema com o carro. A Cida sempre coloca o carro dela torto daquela maneira, e eu nunca consigo sair rapidinho da garagem. A Cida devia tomar jeito! Outro dia – olha só – ela conseguiu entupir a pia do banheiro, tirando cabelo da escova...

- Ah é!?

- É! E você reclamando dos meus cabelos no ralo... Mas então! Eu consegui chegar ao trabalho, mas me atrasei! O trânsito estava um caos... (nossa falei igual àquela jornalista, que faz o programa das cinco no SBT! É que você não assiste, mas ela fala assim: “o trânsito estava um caos...”).

- ...

- Cheguei, né! Então, aí, eu percebi que os relatórios que eu precisava não estavam em minha mesa. Eu tenho certeza de que aquela estagiária não gosta de mim! Eu pedi os relatórios com urgência. Aí, chego atrasada, e cadê os relatórios? Ela tava com um brinco horrível!

- Olha, amor... Deixa-me ver ali a notícia! Parece que o Mano Meneses vai escalar o Ronaldo...

- Falando em Ronaldo, e o Ronaldo! Lembra dele? Eu o vi ontem, saindo de um barzinho aqui perto. Não sei como a esposa dele agüenta... coitada! Trabalha tanto!

- Amor!

- Oi!

- Mas então... Estou bem cansadinha... Depois que consegui os relatórios elaborei todas as planilhas... Não almocei. Fui direto fazer aquela apresentação! Fiquei três horas falando... falando! Nem consigo falar mais!

- É?

- Você não está vendo?

- Hum...

- Enfim, meu dia foi uma correria!

- Deita aqui então... Deixa-me fazer um cafuné em você!

- Deito sim amor!

...

- Amor! Lembra daquele...

- Vida... Fica quieto que começou a novela... Você não para de falar!

NO TEMPO DAS RECORDAÇÕES

Quando vou a festas de família, ou algumas reuniões de amigos, é inevitável a presença dela. Lembro-me, porém, das épocas em que era objeto raro, cobiçado e possuído por poucos, sendo esses poucos, sempre japoneses. Essas épocas mudaram, e, como falara no começo, a presença dela, uma câmera digital, é inevitável. A todo o momento flashs são disparados, pessoas fazem poses e elocucionam o que já pode ser considerado um jargão de fotografados: “Deixa eu ver?” – sim, com o pronome reto do Bagno. Não consigo imaginar uma cena em que há uma câmera digital e não há uma pessoa para pronunciar tal frase.

Outro dia, porém, presenciei uma cena nostálgica, a que fez me lembrar de vivências que nunca tive, mas que estão internalizadas em mim – sabe Deus como. Lembrei-me daquelas máquinas fotográficas enormes, com um pano e um tripé, que tiravam a fotografia em meio a fumaças e explosões. Lembrei-me disso não por ver uma máquina assim, mas por participar de uma cena parecida com as que envolviam tal aparelho. Em uma dessas festas que costumo ir, depois de inúmeras fotos digitais armazenadas nos cartões de memória, uma senhora apareceu com uma máquina de filmes, modelo simples, e pediu para todos se reunirem para ela bater uma foto. Eu, junto das outras pessoas que comigo estavam, me posicionei, e, ela, sem muito esperar, apertou o botão e tirou a foto. Imediatamente guardou a câmera e se retirou. Todos se dispersaram e voltaram ao que faziam antes, mas creio que, em poucos segundos, num relapso de tempo, todos pensaram em pedir para ver aquela foto, a fim de ratificá-la, ou não; a fim de confirmá-la, ou não. Eu mesmo tive essa vontade.

Mas fomos podados pelo tempo. Fomos impedidos pelo tempo das máquinas do tripé; pelo tempo das máquinas convencionais, que privavam o fotografado do direito de se auto-analisar, de dizer “deixa eu ver” e depois “essa ficou ruim, vamos tirar outra”. Fomos podados pela recordação. Aquela foto, tirada pela senhora, não era para ser vista pelos fotografados, mas sim, por ela e somente por ela. E, para ela, não importava a quantidade de fotos, a qualidade ou a autorização dos fotografados. Interessa a recordação, que ela já havia queimado no filme, e que já havia se eternizado. Ela tinha sua recordação. E nós, jamais nos veremos naquela foto.

O MENDIGO

Era perto das sete, quando atravessei a praça da biblioteca pública, cruzei a Duque de Caxias e alcancei o portão de minha casa. Presenciava uma tarde morosa em Rolândia – típica de Dezembro, com pessoas caminhando, crianças brincando e jovens passeando. Quase nada incomum: tudo era conforme era há tempos. Exceto uma coisa. Um mendigo que deixei deitado próximo a um banco ao cruzar a praça. Pouco nele reparei, confesso, mas o fiz suficientemente para notar que ele não era parte do ambiente ordinário de minha praça. Conhecia os que a frequentavam e os que a utilizavam para diminuir distância. Os que por ali dormiam também. Esse mendigo era novo ali, porém não para modificar a paisagem rotineira de uma cidade, mesmo que pequena como a minha – figuras de mendigos eram sempre velhas naquela praça e em qualquer outra; na minha cidade e em qualquer outra.

E por isso pouco liguei para a novidade. No dia seguinte, ao atravessar a praça, o procurei para ver se ali ainda estava e o achei. Queria notar melhor aquela figura. Pele queimada, barba por fazer, maltrapilho – o de sempre, de sempre. Caminhava sem rumo a passos curtos, mas em minha direção. Não me assustei, mas me incomodei com o provável encontro. Já imaginava o que iria pedir e como eu iria negar. Um dinheirinho? Não teria - para ele comprar pinga? - Leite em pó? Não teria crianças, certamente. Um prato de comida - que passasse mais tarde, no horário do jantar (meu pai me ensinou a não negar pratos de comidas. Ensinou a negar somente o prato. Usa-se uma embalagem velha de lanche para dar a comida, dizia ele).

Com o semblante fechado o recebi em meu caminho. Procurei desviar, mas impossível foi. Senhor! Oi? Respondi cabisbaixo buscando me safar. É que... Não tenho nada, estou voltando do trabalho. Sei, pois. Pois então? Quer alguns trocados? O quê? Você quer alguns trocados? Não. Espera? É que... Você me ofereceu dinheiro? Sim! Ora, me oferecia dinheiro o mendigo. Não pedia, me oferecia. E eu, eu não entendia... confundia. Olhava aquele homem oferecendo-me trocados, ao invés de pedi-los. Cheguei a abrir a carteira e deparar-me com a carteira dele aberta. Ele tinha carteira. Já não sabia se era ele ou eu quem devia estender uma nota.

Recebi cinco reais. Agradeci. Ele continuou a caminhar. Algumas pessoas me olhavam, outras riam. Num momento pensei que se trava de alguma brincadeira. Não era. Aquele homem era sim um transeunte e me dera cinco reais. Cinco reais, em nota, mirrada, dobrada. Cinco reais que jamais pensara em receber ou ganhar daquela forma. Creio que ninguém ali jamais pensara em viver algo semelhante.

Retomei meu caminho de casa, preocupado com a falta que tal montante lhe faria, entretido com o que faria com tal montante. Até cheguei a pensar que era a vida me ensinando lição - quem pouco tem, mais generoso é... - Mas cinco reais? Não é algo que inspira uma lição de moral. Eu também não inspiro uma cena assim...

Atravessei a Duque de Caxias mais uma vez, como sempre, mas dessa vez moribundo e com cinco reais na mão e uma sensação de que algo me faltava. Não era dinheiro. Era algo que não sabia explicar, mas provocava saudosismo demasiado, como se fosse privado, naquela tarde, de alguma coisa. Guardei os cinco reais.

COMO EU ME CONHECIA

Se há um lugar que eu pensava conhecer é a Avenida dos Expedicionários. Essa avenida sempre foi o elo entre minha casa e o centro da cidade. Sempre foi por ela que me dirigi ao colégio, às lojas, à igreja. Era ela que me levava às noites de sábado também. Nela, costumava a transitar cumprimentando os moradores de suas casas. Conhecia todos. E conhecia também os que nela não moravam, mas a utilizavam como eu. Era raro não ter alguém para falar um alô, ou para acompanhar-me em meu trajeto. Lembro-me até de uma tarde em que um colega fez eu me sentar em no meio-fio para lhe ensinar uma música no violão.

Na Avenida dos Expedicionários fica o calçadão de Rolândia. Conhecia-o bem também. Ao contrário do de Londrina e do de Cambé, o de Rolândia é cortado por uma rua e tem uma fonte. Não é bem um calçadão. Nele há apenas algumas lojas, uma sorveteria, uma escola de inglês e a única banca de jornal da cidade. Passam por ele inúmeras pessoas: das típicas de Rolândia, às típicas de qualquer cidade. Eu por lá passava muito também, uma vez que ele se ele localizava na Avenida em que eu estava todo dia. Quase todo dia.

E, tanto na Avenida quando no calçadão, tudo sempre me era familiar, igual aos programas de domingo na TV. Essa sensação de familiaridade, na minha cabeça, jamais me deixaria. Mas me deixou. Ontem, subi a Expedicionários para ir até o centro cortar meu cabelo. Depois que o babeiro em que eu costumava ir morreu, passei a cortar o cabelo no centro da cidade e ir a pé. Era manhazinha e não me surpreendi em não encontrar nenhum conhecido. Deviam estar os que podiam dormir, dormindo, e os que não podiam, trabalhando. Surpreendi-me, porém, ao chegar ao calçadão. Na loja de roupas, notei um café, que nunca havia notado. Na sorveteria, nada notei. Mas estava lá ainda, porém, no lugar de outra loja de roupas. E as lojas roupas? Lá não mais estavam. Pelo menos a escola de inglês ainda estava no lugar e a fonte ainda fonteava como sempre. Mas não era como sempre. O calçadão de Rolândia mudara pouco, mas mudara, e eu não imaginava que podia acontecer isso. A sensação de ver pequenas coisas diferentes num lugar em que, para mim, nada nunca estaria diferente me fez perceber que o fluxo das mudanças atinge também a mim. E notei que eu nunca dera aula, como entendo hoje que sempre fiz, que eu nunca escrevera como entendo hoje que sempre fiz, que eu nunca estudara Linguística, como entendo hoje que sempre fiz. Que isso não é tão familiar, quanto parece. O que eu sempre fazia era tocar violão, conversar com amigos e escrever músicas.

Cortei o cabelo. No caminho de volta, reparei mais uma vez no novo café e no lugar novo da velha sorveteria. E na Expedicionários, na volta, mais uma vez não encontrei ninguém. Senti-me estranho. Já em casa, ao olhar no espelho, com o cabelo podado, notei-me sem o velho semblante familiar. Senti-me estranho. Contudo sabia que voltaria ao normal. O que não voltaria, entretanto, a Avenida dos Expedicionários e seu calçadão como eu a conheci bem e como eu me conhecia.

domingo, 11 de abril de 2010

NOVA CARA

Mudanças no blog. Como não conseguir fazer a função “comentários” funcionar no antigo formato, tive que mudá-lo. Embora muito mais simples e sem aquela xícara de café que era bacana pra**, esse novo modelo permite comentários. Espero ter interlocutores agora! Para comentar, basta estar com o orkut loado, ou com qualquer outra conta google aberta.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

CULTURA

Roubaram minha Veja dessa semana. Preciso pedir ao entregador que arremece com mais força.

domingo, 4 de abril de 2010

CARREIRA?

Ontem, enquanto zapeava canais na TV aberta, deparei-me com aquela guria que foi hostilizada há um tempo por usar um vestido muito curto em uma faculdade. Ela estava escolhendo um namorado e, para isso, fazia algumas perguntas aos candidatos, a fim de conhecê-los melhor. Uma das perguntas que ela fez foi: “Você vai saber conciliar nosso namoro com minha carreira?”

Carreira? Que carreira, meu Deus?

Ficar até madrugada resenhando livro de linguística ninguém quer. Usar vestidinho curto e escolher namorado na TV...

sexta-feira, 2 de abril de 2010

TWITTER

Como mal consigo manter esse blog sempre atualizado, resolvi não aderir ao twitter para não ter outro compromisso virtual. No entanto, a curiosidade de compreender qual a emoção de escrever qualquer bobagem em 140 caracteres foi maior e me fez abrir esse espaço no blog! A partir de hoje, compartilharei algumas coisas nesse tag – twitter – sempre que possível! Começando por esse poema, de Paulo Leminski, que muito tem a ver com a situação!

Razão de Ser (Paulo Leminski)

Escrevo. E pronto. Escrevo porque preciso, preciso porque estou tonto. Ninguém tem nada com isso. Escrevo porque amanhece, E as estrelas lá no céu Lembram letras no papel, Quando o poema me anoitece. A aranha tece teias. O peixe beija e morde o que vê. Eu escrevo apenas. Tem que ter por quê?