sexta-feira, 28 de maio de 2010

A EMBARAÇOSA SITUAÇÃO

Creio que há duas vergonhosas situações da vida as quais todo mundo já viveu. A primeira delas é o aceno sem destinatário, o aceno enganoso. Ora, quem nunca cumprimentou aquela pessoa que se abrira em risos e gestos saudosistas, que olhara em sua direção, mas que cumprimentara outrem. Acredito que muita gente isso já fez, enganados pela pegadinha lógica "não lembro quem é, porém, pela empolgação com que me saúda, há – parece-me – muito tempo que não nos vemos". Muita gente. E pela pegadinha lógica.

Não é, contudo, dessa situação de que quero tratar. Quero tratar da outra, cujo embaraço causado é maior. Quisera eu ter acenado a mil pessoas das quais não me "lembrava" a ter proferido a seguinte frase: "mãe, traz papel!". É, pois, papel. O higiênico mesmo. Essa é uma situação pela qual todos já devem ter passado. Por isso digo: quão abençoados são aqueles artefatos de crochê, pendurados atrás da porta, cheio de rolos de papel a espera de uso! Deveria haver um dia em homenagem a eles. E deveria ser lei checá-los uma vez ao dia, para que jamais faltasse a celulose com o trágico destino.

Considero mais embaraçoso essa situação, porque revela a insignificância humana diante da falta de papel-higiênico no banheiro. Não há o que fazer, quando ele falta, senão pedir ajuda. SOS. Socorro. São quais, pois, as alternativas? Usar a toalha de rosto? Tomar um banho? Vestir-se e ir buscar? Tomar uma chuveiradinha do bidê? Nenhuma é tão viável como gritar alguém. O problema é que gritar "mãe, traz papel", ou "fulano, traz papel" não soa com esse significado. Soa como "acuda-me, quero limpar meu anus e não sou capaz!" É humilhante.

E aí a psicanálise explica: quando somos crianças, tal atitude é normal –"mãe, vem me limpar!". Mas aí, as mães cansadas dessa situação apresentam-nos o papel-higiênico e dizem: "se vira!" É a castração. Essa atitude faz do ato de limpar a bunda algo que nosso superego busca, a todo custo, omitir, como se não o fizéssemos. É por esse motivo que, quando falta o papel, a sensação de insignificância. É, pois, impossível "se virar", ser autônomo. Garotas bonitas, por exemplo. Creio eu que elas não limpam a bunda. Não dá para imaginar isso. Na verdade, elas nem precisam disso. Elas eliminam tudo do suor, dizem.

Mas, embora tudo isso, é de se aliviar quando a sensação de insignificância é tida ao se chamar a mãe. Problema é quando não há a mãe para buscar nada. Nem o pai. Ou quando nem em própria casa nos encontramos. Na casa da avó, imagine! Com toda família reunida, não dá para ficar gritando a falta de papel. Deixa de ser um pedido a atitude e passa a ser um anúncio. "E aí, family, eu não tenho papel!". Na casa da namorada nem se fala. "Amor... Pega papel-higiênico para mim?" E imagina no trabalho? "Ei, Siqueira! Busca um rolo de papel-higiênico, aí". "Deixa eu atender aqui o freguês, que já vou!". Ao menos dá para se inventar uma desculpa: "Siqueira! Traz o relatório de compra e venda para eu ler enquanto estou no banheiro! Acho que fiz uma cagada...".

Pois é. Complicado. E acontece com todo mundo. Ao menos há um lado positivo em ficar sem papel, diante dos acenos sem destinatários. Após a humilhação de ter que pedi-lo, o que vem é o alívio. Quando se acena à revelia, o problema é justamente o que acontece depois.

Um comentário:

  1. ow prof... foi vc que escreveu???

    inspirado na sua vizinha neh?

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